Visão Global

A queda de Ernesto Araújo

O ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, pediu demissão do cargo nesta segunda-feira (29/3). Ele caiu depois de disparar contra a senadora Kátia Abreu (PP-TO). Segundo especialistas em relações internacionais, o legado de Ernesto Araújo é “trágico”.

O presidente Jair Bolsonaro e seu filho, deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), até agora não se manifestaram sobre a situação demissionária de Ernesto.

Magoado com demissão de seu pupilo, o astrólogo Olavo de Carvalho foi lacônico no Twitter: “Katia Abreu não presta.

O chanceler Ernesto Araújo poderia ter sido o primeiro ministro de Estado a sofrer impeachment na história da República do Brasil, desde 1889, se ele não tivesse pedido demissão e o presidente Jair Bolsonaro não o demitisse.

A crise final ocorreu depois que o ministro das Relações Exteriores atacou neste domingo (28/3), pelas redes sociais, a senadora Kátia Abreu (PP-TO). Prevaleceu o espírito de corpo no Senado. A maioria dos parlamentares pediu a cabeça do chefe do Itamaraty ao presidente Jair Bolsonaro, que foi alertado sobre o possível impeachment de Ernesto.

O ministro caiu em desgraça absoluta ao publicar no Twitter sobre um almoço que teve com a senadora Kátia Abreu no início de março. Segundo Ernesto Araújo, ele que teria ouvido da senadora que se tornaria o “rei do Senado” se fizesse um gesto em relação ao 5G, mas que não fez “gesto algum”.

“Em 4/3 recebi a senadora Kátia Abreu para almoçar no MRE. Conversa cortês. Pouco ou nada falou de vacinas. No final, à mesa, disse: ‘Ministro, se o senhor fizer um gesto em relação ao 5G, será o rei do Senado.’ Não fiz gesto algum”, escreveu Ernesto em sua conta no Twitter neste domingo (28/3).

Desconsiderei a sugestão inclusive porque o tema 5G depende do Ministério das Comunicações e do próprio Presidente da República, a quem compete a decisão última na matéria”, completou.

A vontade do Senado aprovar o impeachment do ministro era grande. Desde o ano passado, senadores procuram mudar a política fundamentalista do Brasil no exterior.

Ao fazer uma análise do legado do chanceler, o professor de Relações Internacionais da UFRJ, Fernando Brancoli, em entrevista à Sputnik Brasil, avaliou que Ernesto Araújo forjou uma aliança imediata com o ex-presidente dos EUA, Donald Trump, e Israel, em detrimento de outros tradicionais aliados brasileiros, que teria isolado o país na arena internacional.

De acordo com ele, a eleição de Joe Biden nos EUA mudou o cenário para a política externa brasileira, tendo em vista que o próprio Ernesto Araújo e o presidente Jair Bolsonaro chegaram a afirmar que a eleição norte-americana poderia ter sido fraudada. Para Brancoli, a derrota de Trump e a reação da diplomacia brasileira “deixaram o Brasil em uma posição muito ruim“.

A política externa dele como legado é muito trágica, muito ruim. Ele apostou todas as fichas em uma relação carnal com Trump nos EUA, e aí não com os Estados Unidos, mas com a figura de Trump, o que ajuda a explicar porque que ele perdeu tanta influência desde a chegada do Biden nos últimos meses“, afirmou.

O professor de Relações Internacionais observou que Ernesto Araújo “isolou tradicionais aliados brasileiros”, como o caso da Argentina e os países árabes, que foram deixados muito de lado durante a gestão do chanceler. “Em parte também por essa aproximação com Trump, que fez com que ele tenha se colocado como um aliado de primeira hora de Israel“, complementou.

Outro fator marcante da atuação de Ernesto Araújo no comando do Ministério das Relações Exteriores foi a deterioração das relações com a China. Fernando Brancoli lembra que “desde a chegada de Bolsonaro ao poder, a China vinha sendo colocada como um possível antagonista“.

Mesmo com Bolsonaro ainda candidato, ele faz menção ao que ele vê como práticas expansionistas da China, e o Ernesto Araújo continua esse discurso após a eleição […] Obviamente a coisa começou a apertar, porque a China é o maior parceiro para dar apoio na questão das vacinas“, declarou.

No início do ano, a diplomacia brasileira se viu diante de entraves para conseguir o fornecimento por parte da China e da Índia de doses de vacina e insumos para a produção de imunizantes contra a COVID-19 Brasil. O agravamento da pandemia no país aumentou a pressão sobre o trabalho de Araújo.

Segundo o especialista, a figura do Ernesto Araújo acabou materializando a insatisfação com o governo Bolsonaro, formando a ideia de um país isolado. A opinião sobre o “legado trágico” de Ernesto Araújo é praticamente uma unanimidade entre os estudiosos do tema de Relações Internacionais.

Com informações do Site Desacato e da agência Sputnik News

 

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