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Chile: Câmara abre processo de impeachment de Piñera

A Câmara dos Deputados do Chile aprovou na madrugada desta terça-feira (9) a abertura de uma acusação constitucional – equivalente a um pedido de impeachment – contra o presidente neoliberal Sebastián Piñera. O pedido teve 78 votos favoráveis (o mínimo necessário) e 67 contrários. Houve, ainda, três abstenções. Com isso, Piñera não pode sair do país.

A sessão foi histórica para os parlamentares chilenos. Em uma exaustiva e peculiar jornada de 22 horas de duração, o deputado socialista Jaime Naranjo passou 15 delas lendo uma apresentação de 1.300 páginas, com o único objetivo de prolongar a sessão até a madrugada. É que o voto decisivo cabia a um deputado que cumpria quarentena por covid-19 até a meia-noite. Numa manobra de obstrução parlamentar nunca vista no Congresso, o longo discurso de Naranjo provocou tanto interesse quanto seu resultado.

É a segunda vez que os parlamentares discutem a destituição de Piñera – a primeira teve relação com a onda de protestos de 2019. Desta vez, conforme revelado nos Pandora Papers, ele é acusado de irregularidades na venda, em 2010, da mina de Dominga – um projeto abrangente de cobre e ferro da família do presidente chileno – para o empresário Carlos Alberto Délano. Além disso, a acusação envolve uma transação nas Ilhas Virgens Britânicas (um paraíso fiscal). À época, Piñera, um empresário bilionário, estava no ano inicial de seu primeiro mandato presidencial.

O Ministério Público do Chile abriu uma investigação para apurar se houve pagamento de propina e violações tributárias na transação. Nunca antes um presidente chileno havia sido investigado pelo Ministério Público por causa da sua função pública. Tampouco nunca no passado recente um mandatário chileno encerrou antecipadamente seu mandato – o último foi Salvador Allende, alvo de um golpe militar em 1973.

Pesquisa de opinião revelou que 67% dos chilenos concordam com a acusação contra Piñera. O impeachment precisa de maioria simples para ser aprovado na Câmara, mas no Senado são necessários dois terços votos. Se a acusação for adiante, o presidente deixará o cargo e ficará impedido de exercer funções públicas por cinco anos. Seu mandato atual vai até 11 de março de 2022. Depois de ser formalmente notificado da decisão na Câmara, o Senado terá um prazo de até seis dias para agendar a votação.

Não importa o cansaço, porque a # Acusação Constitucional de Piñera foi aprovada na Câmara. Um passo importante para o Chile, que não quer mais impunidade ou corrupção”, tuitou a deputada Camila Vallejo, do Partido Comunista. “Agora é a vez do Senado ficar do lado do que o povo está pedindo e não defender um presidente nefasto!

A peça de acusação contra Piñera, um documento de 285 páginas, menciona “atos de sua Administração que comprometeram gravemente a honra da Nação e infringiram abertamente a Constituição e as leis”. Segundo o texto, “a conduta reiterada e negligente do Presidente da República não só vai contra o princípio da probidade definido constitucional e legalmente, mas, adicionalmente, a sua violação implica a violação do artigo 19 n.º 8 da Constituição que em seu sentido amplo, é um mandato irrestrito de respeitar o meio ambiente”.

A oposição a Piñera trabalha contra o relógio para que a acusação constitucional possa ser votada antes de 21 de novembro, data da eleição que escolherá seu sucessor e renovará boa parte do Congresso. Trata-se de uma campanha polarizada, em que os favoritos, de acordo com as últimas pesquisas, são o deputado Gabriel Boric (da esquerdista Frente Ampla, em aliança com o Partido Comunista) e o líder do Partido Republicano, José Antonio Kast (da direita radical, que não participa da atual coalizão de Governo). Eles devem disputar de um segundo turno em 19 de dezembro.

No país, uma acusação constitucional é um mecanismo do Congresso que visa esclarecer as responsabilidades políticas em cargos públicos por qualquer infração à Constituição. Após um julgamento político, o acusado pode ser destituído do cargo ou desqualificado.

Em 2019, a Câmara já havia tentado iniciar uma acusação constitucional contra Piñera pelas “graves e sistemáticas violações de direitos humanos cometidas por agentes do Estado” durante o surto social. No entanto, a medida não teve sucesso por não recolher os votos necessários.

Agora, o debate sobre os atos presidenciais já parece suficiente para sacudir a eleição presidencial. O ex-líder estudantil Boric, de 35 anos, voltou a despontar como favorito dos chilenos com sua política de inclusão dos refugiados, propostas de descentralização do poder e ideias feministas e ambientais. Depois de testar positivo para a Covid-19 na quarta-feira passada, quando pretendia tomar a terceira dose da vacina contra o novo coronavírus, ele deve cumprir uma quarentena de, ao menos, dez dias.

Já Kast, advogado de 55 anos, que liderou por semanas as pesquisas de intenção de voto e aparece em um empate técnico com Boric, é um ultraconservador, com discurso contrário ao aborto, à imigração e a grupos minoritários. A senadora e professora de centro-esquerda Yasna Provoste (Partido Democrata Cristão do Chile) ocupa o terceiro lugar nas pesquisas, mas em todas apresentou porcentagem abaixo da dupla.

No país não é permitido realizar pesquisas eleitorais 15 dias antes da votação. Em razão disso, no sábado (6.nov), iniciou-se um período de expectativas às cegas para o resultado das urnas. Se os últimos balanços se concretizarem, é provável que um dos candidatos não atinja o número de votos suficientes para ser eleito no primeiro turno, levando a uma nova votação.

Da redação, com CNN, El País e agências

 

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