Luta dos povos

Os 45 anos do fim da Guerra de Libertação do Vietnã

A chamada “Guerra do Vietnã” , que os vietnamitas chamam de Guerra de Libertação, teve início em meados da década de 60 do século passado, após os patriotas e revolucionários vietnamitas terem derrotado completamente o  exército colonial mais experiente da época, o Exército Francês, na histórica batalha de Dien Bien Phu, em 1954. Os “conselheiros” americanos que atuavam já com os militares franceses resolveram substituir os franceses na tarefa de continuar a exploração do povo e das riquezas naturais do Vietnã.

Por Pedro Oliveira*

Ao escrever seu Testamento — algum tempo antes de falecer em 1969 — o líder e condutor da Libertação do Vietnã, Ho Chi Minh, gravou na alma do povo vietnamita as seguintes palavras:

“A guerra de resistência contra a agressão americana pode ainda se prolongar. Nossos compatriotas poderiam ter que consentir em novos sacrifícios em bens e vidas humanas. Ainda que assim seja, devemos estar determinados e combater o agressor americano até a vitória total. Nossos rios, nossos montes, nossos homens ficarão sempre. E o Yankee batido, construiremos o país dez vezes mais belo. Quaisquer que sejam as dificuldades e privações, nosso povo vencerá certamente. Os imperialistas americanos devem debandar seguramente. Nossa pátria certamente se reunificará. Nossos compatriotas do Norte e do Sul serão com certeza reunidos no mesmo teto. Nosso país terá a insigne honra de ser uma pequena Nação que terá vencido, em um combate histórico, dois grandes imperialismos – o francês e o americano – trazendo uma digna contribuição ao movimento de libertação nacional”.

A Comissão Militar Central monitorou os movimentos da campanha “Ho Chi Minh”, em abril de 1975, liderada pelo mundialmente lendário comandante Vo Nguyen Giap

Após seis anos deste Testamento escrito, exatamente às 13 horas do dia 30 de abril de 1975, o porta-voz da administração fantoche do Vietnã do Sul, Duong Van Minh, então denominado presidente da administração de Saigon, conclamava a todos os seus soldados a depor suas armas e incondicionalmente se render ao Exército de Libertação, dissolvendo a administração central em todos os níveis e cedendo o poder ao Governo Revolucionário Provisório da República do Vietnã do Sul.  Em seguida o representante do Exército de Libertação declarou alto em bom som: “Em nome do Exército de Libertação, aceito a rendição incondicional”.

Povo celebra vitória da libertação

Entre estes dois fatos históricos, podemos dizer que os agressores estadunidenses tiveram as seguintes perdas humanas e financeiras:

Foram 57 mil 692 oficiais e soldados mortos, 300 mil feridos, 100 mil inválidos;

Cinco mil aliados americanos morreram durante a guerra;

41% dos veteranos de guerra foram presos nos EUA após o fim do conflito;

40% dos veteranos ficaram desempregados nos Estados Unidos;

274 bilhões de dólares foi o cálculo feito pelos EUA com despesas diretas da guerra;

Artilharia de infantaria do Vietnã preparada para a ação

Outras despesas correlatas elevam o custo da guerra a 920 bilhões de dólares – enquanto as despesas da II Guerra mundial são calculadas em 341 bilhões e a Guerra da Coreia avaliada em 54 bilhões de dólares;

Muitos veteranos de guerra estadunidenses cometeram suicídio; enquanto outros sofreram de doenças mentais; A rádio Voz da América do dia 29 de março, em  1989, relatou que cerca de 480 mil soldados que lutaram no Vietnã sofreram doenças mentais, e não lhes foram fornecidos o tratamento adequado e outros se recusaram a fazer o tratamento;

Acrescentando às despesas diretas, outros custos de tratamento aos feridos, pensões a oficiais, entre outras despesas em juros, pode-se dizer que os custos globais da guerra chegam ao montante de 1 trilhão e 647 bilhões de dólares, ou seja 19 mil e 965 dólares por cada americano da população dos EUA na ocasião;

O Presidente Ton Duc Thang e os líderes do Partido e do Estado no palco da vitória histórica

De agosto de 1964 a janeiro de 1973, 4 mil e 181 aviões da Força Aérea americana foram derrubados no Vietnã do Norte;

De 1964 a 1973, 296 navios foram afundados pelo Vietnã do Norte no Mar do Sul da China;

De 1961 a 1975, foram destruídos ou capturados 38 mil 835 tanques de guerra e carros armados, 13 mil 153 peças de artilharia foram desativadas.

Na manhã de 30 de abril de 1975, o exército de libertação entrou em Saigon pela ponte Thi Nghe

Do lado vietnamita:

Dois milhões e 284 mil pessoas morreram no conflito, dos quais 1 milhão e 921 mil vietnamitas;

450 mil civis sul-vietnamitas morreram entre 1965 e 1975;

40 mil civis sul-vietnamitas foram executados na implementação do Projeto Fênix dos EUA;

176 mil soldados do regime de Saigon morreram entre 1961 e 1972;

900 mil soldados combatentes no Norte e da FLN morreram entre 1961 e 1972;

200 mil civis norte vietnamitas morreram entre 1961 e 1975;

Às 10h24 de 30 de abril de 1975, o presidente fantoche de Saigon, Duong Van Minh, declarou a rendição incondicional

Outras consequências da guerra:

Três milhões e 200 mil vietnamitas, cambojanos e laosianos feridos;

14 milhões e 305 mil refugiados, dos quais 10 milhões e 472 mil no sul do Vietnã e 3 milhões e 83 mil no Camboja e 750 mil no Laos;

No sul do Vietnã registraram-se, ademais, 300 mil órfãos;

800 mil crianças perderam um de seus pais;

83 mil amputados;

181 mil incapacitados;

40 mil surdos ou mudos;

Oito mil paraplégicos;

131 mil viúvas da guerra;

200 mil mulheres induzidas à prostituição e 100 mil prisioneiros políticos;

No Camboja contam-se 480 mil civis mortos ou feridos e 260 mil órfãos ou meio órfãos;

No Laos, 350 mil civis morreram ou ficaram feridos.

5:30 da manhã 30 de abril de 1975, a 10ª Divisão, coordenada com 2 tanques do 273º Regimento de Blindados, atacou o aeroporto internacional Tan Son Nhat

Toneladas de bombas e munições empregadas

Os Estados Unidos empregaram 15 milhões e 500 mil toneladas de bombas e munições de todo o tipo na Indochina, das quais 12 milhões no sul do Vietnã. Estima-se que tamanho poderio equivaleria a 640 bombas atômicas do tipo utilizado em Hiroshima, quase duas vezes e meia do total usado em toda a Segunda Guerra Mundial (Seis milhões de toneladas);

Sete milhões e 800 mil toneladas de bombas jogadas pelos EUA na Indochina;

Sete milhões e 500 mil toneladas de munições empregadas pelas forças terrestres americanas;

200 mil toneladas de munições usadas pelas forças navais contra alvos terrestres.

Soldados do exército de libertação correndo para o Palácio da Independência com a bandeira revolucionária

Destruição ao final da guerra:

26 milhões de crateras causadas por bombas, das quais 21 milhões no sul do Vietnã;

Mil milhas quadradas do Sul do Vietnã foram aplainadas por tratores;

Mil milhas quadradas foram destruídas por bombas incendiárias ou de alto impacto;

Entre 150 mil e 300 mil toneladas de munições não explodidas encontram-se espalhadas por toda a Indochina.

Este quadro de horror e destruição foi o resultado de uma política imperialista naquele pequeno território do sudeste asiático. Estes dados que se pode obter no Museu da Guerra na atual Cidade de Ho Chi Minh – como foi denominada a antiga capital do Vietnã do Sul, Saigon – são os dados quantitativos de uma tragédia organizada e levada a cabo por três administrações de governos dos Estados Unidos, contra um país pobre, pequeno e praticamente desarmado. Mas o pior não está nestes números, mas na utilização de um gás chamado agente laranja e outros produtos tóxicos desfolhantes usados para destruir lavouras e abrir clareiras para identificar a resistência popular dirigida pela FNL. No Museu, sabe-se , por exemplo, que 19 milhões de galões de herbicidas, a maioria sendo agente laranja, foram empregados pelos EUA na guerra de 1961 a 1971, agente que causa câncer e outros problemas de saúde e que 200 mil veteranos de guerra dos EUA foram afetados pelo produto.

Tive a oportunidade de visitar este Museu da Guerra em 2008, fazendo parte de uma delegação do Partido Comunista do Brasil que visitou o Vietnã, dirigida pelo então presidente do PCdoB, Renato Rabelo.  Fiquei vivamente impressionado com o que vi. Fotos dramáticas de tortura aos presos políticos, e também de vietnamitas afetados pelo agente laranja até os dias atuais, um crime inacreditável.

Da mesma forma se pode conhecer no mesmo Museu — por muitas fotos e cartazes o apoio à luta dos vietnamitas e pela paz em inúmeros países – o outro fator decisivo para a solução da guerra de Libertação: manifestações e lutas de resistência ocorreram nos principais centros políticos do mundo, especialmente na França, nos Estados Unidos e em países da América Latina, da África e da Ásia. No último dia 25 de abril, por exemplo, comemorou-se nos EUA a marcha que reuniu 500 mil pessoas contra a Guerra do Vietnã. No Brasil, também realizamos inúmeros atos pela paz e contra a guerra em universidades e capitais de vários Estados brasileiros.

Fuga desabalada de estadunidenses e aliados

No documento do PCdoB por ocasião do aniversário de nascimento de Ho Chi MInh – e este ano teremos a comemoração dos seus 130 anos – está dito: ”Foi possível descortinar a possibilidade de vitória de um pequeno país dominado pelo colonialismo sobre um império colonial poderoso, mais forte e melhor equipado do ponto de vista militar. Ho Chi Minh concebeu a resistência como uma guerra insurrecional – uma guerra de todo o povo oprimido. A luta de resistência deveria levar em consideração as posições de força, as oportunidades, as condições do terreno e de clima e a união do povo. Este último fator foi fundamental em função do patriotismo, da tradição de luta contra os agressores estrangeiros, a consciência política e organizativa que se transformou numa verdadeira muralha de aço contra os inimigos da pátria. De uma forma mais abrangente, a luta se desenvolveu em várias frentes ao mesmo tempo: na esfera militar propriamente dita, no plano político, econômico, cultural e diplomático”. Ou seja, é possível derrotar o imperialismo com a mobilização completa do povo oprimido.

Em um dos Escritos de Ho Chi Minh, carinhosamente chamado pelo povo de Tio Ho, sobre “Como escolhi o leninismo” podemos ler: “De início, foi o patriotismo e não o comunismo que me deu confiança em Lênin e na III Internacional. Etapa por etapa, sempre através da luta, estudando o marxismo-leninismo através das minhas atividades no partido, cheguei, gradualmente, à conclusão de que somente o socialismo e o comunismo poderiam libertar as nações oprimidas e a classe operária de todo o mundo da escravatura”.

* Jornalista, Secretário-Geral da Associação de Amizade Brasil–Vietnã (Abraviet) e membro da Comissão de Relações Internacionais do Partido Comunista do Brasil (PCdoB) 

 

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