Outro navio com fosfato extorquido pelo Marrocos deve chegar ao Brasil
Está a caminho do porto de Santos, com chegada estimada em 19 de junho, mais um navio carregado de fosfato saarauí, explorado e exportado pelo Marrocos. O Lalis D (IMO 9613666), de bandeira da Libéria, partiu do porto de El Aiún, no Saara Ocidental ocupado. A prática é reiterada: este pode ser o quarto cargueiro do tipo a chegar ao Brasil em um ano.
Como já relatado pelo Cebrapaz (Centro Brasileiro de Solidariedade aos Povos e Luta pela Paz), a importação de fosfato saarauí ilegalmente explorado é sistemática e tem peso no comércio exterior brasileiro. Em contato por e-mail e telefone, membros das campanhas de proteção dos recursos do Saara Ocidental relatam novos e antigos casos. A Western Sahara Resorce Watch (WSRW) averigua que o Golden Bonnie, que aportou em Santos em abril, foi o terceiro; o Lalis D pode ser então o quarto navio a chegar ao Brasil carregando fosfato saarauí recentemente.
Em geral, indica-se como proveniência dos recursos o Marrocos, que considera o Saara Ocidental ocupado sua província, dificultando o monitoramento. Mas a exploração dos recursos de um povo sob ocupação é ilegal, uma violação do direito internacional. Por isso, os brasileiros e brasileiras devem acompanhar a questão.
A estatal marroquina OCP (Office Chérifien des Phosphates), que explora as reservas de fosfato para a produção de fertilizantes, tem presença no Brasil há uma década. Em 2010, abriu seu primeiro escritório, em São Paulo, e passou à expansão exponencial, já contando com armazéns em diversos estados. Em 2012 as exportações de adubos e fertilizantes do Marrocos ao Brasil somaram US$ 834 milhões, um aumento de 11% em relação a 2011.
Em 2011, a OCP deu entrada no capital do grupo norueguês distribuidor de fertilizantes Yara International e ambos criaram uma joint-venture no Brasil para importar rocha fosfática e produzir superfosfato; a OCP ficou com 50% de um terminal e uma fábrica da Yara no Rio Grande do Sul, segundo o portal de notícias do setor Comex.
Em 2013, o grupo inaugurou sua filial OCP Fertilizantes Ltda no Brasil, que passava a ocupar o terceiro lugar entre os maiores destinos de exportação de fosfato pelo Marrocos, atrás apenas da França e da Espanha, também segundo o Comex. Reitere-se: o gravíssimo problema nesta relação é que Marrocos não distingue entre os recursos provenientes de suas próprias reservas e aqueles espoliados das reservas saarauís.
O povo saarauí ainda resiste sob ocupação marroquina, no exílio ou em campos de refugiados no deserto argelino, reivindicando a conclusão do processo de descolonização do território há quase seis décadas. Em 1963, o Saara Ocidental, então colônia espanhola, foi listado pela ONU como território não-autônomo pendente de descolonização, mas Marrocos ocupou o território em 1975. Após quase duas décadas de confronto, a realização do referendo de autodeterminação foi acordada entre a Frente POLISARIO e o Marrocos na assinatura do cessar-fogo, em 1991. Até hoje, a implementação do acordo está pendente e o Marrocos já não aceita a hipótese de independência do Saara Ocidental, mas a negociação ou desistência do direito à autodeterminação, para os saarauís, está fora de questão.
Por isso, o espólio dos recursos saarauís, seja as reservas de fosfato e outros minérios, seja um dos maiores bancos pesqueiros do mundo, é central na denúncia da ocupação e da colonização marroquina do Saara Ocidental e deve ser abertamente condenado e barrado. O Brasil não pode ser alheio a esta campanha, especialmente por ter envolvimento direto na questão, neste caso, através do comércio de fosfato para a produção de fertilizantes. Deve agir, em acordo com o direito internacional.
Por Moara Crivelente, diretora do Cebrapaz