Notas Internacionais (por Ana Prestes) – 14/12/20
– Israel e Marrocos deram um passo na direção de estabelecer plenas relações diplomáticas. A declaração foi feita em conjunto pelos dois países e os EUA, que tem estado presente em todos os recentes acordos de Israel com países do Oriente Médio e Norte da África. Só em 2020, Israel conseguiu estabelecer relações com Emirados Árabes Unidos, Bahrein, Kosovo, Sudão e agora Marrocos. No bojo do estabelecimento de relações entre Israel e Marrocos, o presidente Trump avançou algumas casas ao “reconhecer” a soberania do Marrocos sobre o território do Sahara Ocidental. Na verdade, o território é reconhecido justamente por ser um espaço colonizado pelo Marrocos. Com uma população própria e que luta por sua autodeterminação desde 1975, após a independência da Espanha e subsequente ocupação marroquina. Ao dar esse passo, os EUA podem se tornar o único país do mundo a reconhecer o Sahara Ocidental como parte do Marrocos. O que complica ainda mais o cenário de conflito armado na região nas últimas semanas, desde que o Marrocos forçou a passagem em uma das regiões do território saharaui. Na verdade, o gesto dos EUA é parte das negociações do acordo de Marrocos com Israel, pois a opinião pública marroquina em geral é contrária à normalização das relações com Israel. O Rei precisava desse posicionamento americano para mostrar frutos concretos do estabelecimento das relações com Israel. A população do Sahara Ocidental aguarda um referendo com mediação da ONU para avançar com sua independência, mas com o novo gesto dos EUA esse sonho parece cada vez mais distante e a via armada é uma alternativa que já está em curso para proteger seu território e população das autoridades marroquinas. Se há uma coisa em comum entre Israel e Marrocos é que ambos ocupam territórios de outras populações, palestinos e saharauis. Trump, sem nenhum debate no Congresso americano e em vias de passar o poder para outra administração, foi lá e disse que os EUA reconhecem o Sahara ocidental como parte do Marrocos. Vamos ver como Biden lidará com isso. Foto: Embaixador dos EUA no Marrocos, David Fischer, e sua esposa Jennifer, sorrindo ao lado do “novo” mapa do Marrocos.
– Aconteceu no sábado (12) uma reunião virtual do PROSUL, instrumento de integração concebido para substituir a UNASUL. Participaram representantes do Brasil, Chile, Colômbia, Equador, Guiana, Paraguai e Peru. Eles se auto proclamam como os únicos países que respeitam a democracia e os direitos humanos na região. Uma das decisões da reunião foi criar um Grupo de Trabalho Setorial sobre Meio Ambiente. Outro ponto que chamou atenção na declaração do encontro foram as várias citações ao BID – Banco Interamericano de Desenvolvimento, hoje presidido pelos EUA. Ao passarem a presidência pró-tempore do grupo de Piñera (Chile) para Ivan Duque, da Colômbia, os países membros disseram que respaldam seus “permanentes esforços” para implementação de uma “política de paz” com legalidade, “como estratégia eficaz e efetiva para alcançar uma convivência pacífica estável e duradoura”. Acho que eles não leem jornais sobre o que se passa na Colômbia.
– Acontece hoje, nos EUA, a reunião do Colégio Eleitoral que delibera sobre o próximo presidente dos EUA. Composto por delegados eleitos em cada estado, de forma proporcional (em tese pelo menos) ao número de habitantes de cada estado, o saldo final dos votos do Colégio deve ratificar a vitória do democrata Joe Biden que fez a maioria dos delegados. Trump continua não reconhecendo o resultado das urnas. Como funciona? Em cada um dos 50 Estados e no Distrito de Columbia (onde fica a capital Washington) os delegados ou chamados eleitores se reúnem nas assembleias legislativas correspondentes e depositam seus votos. Depois disso, as autoridades dos estados tem até dia 23 de dezembro para enviar as atas das votações para o Senado. No dia 6 de janeiro o Congresso faz sessão conjunta das duas casas para contar os votos do Colégio Eleitoral. Após a contagem, o presidente do Senado (que no caso é o vice de Trump, Mike Pence) declara o vencedor que é dado oficialmente como eleito. Dia 20 de janeiro é a posse.
– Na Polônia, há semanas ocorrem manifestações populares de grandes proporções desencadeadas após uma decisão do Tribunal Constitucional do país que restringiu o direito ao aborto no país, que já era um dos mais restritos da Europa. Pressionado, o governo anunciou o adiamento da publicação e validação da decisão. Nos últimos dias as manifestações voltaram a se intensificar, inclusive com greves de várias categorias de trabalhadores, e agora se ampliaram de modo a contestar de modo geral o governo do presidente Andrzej Duda e do partido de ultradireita Lei e Justiça. A Polônia passou por eleições nesse ano de 2020, como relatei aqui nas Notas de julho, e Duda foi reeleito com uma estreita margem de votos. (Com infos de Mathias Boni do @observint)
– O novo presidente da Bolívia, Luis Arce, está no Brasil. Mas não é para uma agenda bilateral com o governo brasileiro e sim para acompanhamento de um tratamento de saúde que ele segue há meses após ter superado um câncer nos rins em 2017. Antes de sair do país ele passou a presidência para seu vice David Choquehuanca. A oposição boliviana obviamente já se aproveitou do caso para explorar que o presidente não confia no sistema de saúde de seu país, mas o fato é que Arce nem imaginava ser presidente quando começou seu tratamento no exterior. O governo brasileiro não deverá fazer nenhuma nota de boas vindas e com desejos de sucesso no tratamento do líder sul-americano, como seria esperado de qualquer governo presidido pelo bom senso.
– Já circulam nos EUA caminhões e aviões carregados com os primeiros lotes da vacina da Pfizer/BioNTech contra a Covid 19. Essa vacina precisa ser acondicionada em uma temperatura de 70ᵒC negativos. Segundo as matérias da imprensa, quando o primeiro caminhão saiu da fábrica houve palmas dos trabalhadores e funcionários em geral. O desafio logístico chegou a ser comparado por alguns com o Dia D na Segunda Guerra, tão importante para as forças ocidentais. Os EUA estão se aproximando rapidamente dos 300 mil mortos oficialmente pela Covid19. Cada um dos 50 estados poderá determinar sua política de vacinação, mas a orientação do CDC é de que a imunização comece pelos profissionais de saúde e idosos que se encontram em casas de repouso. Antes dos EUA, os seguintes países já haviam aprovado o uso desta vacina: Reino Unido, Canadá, Bahrein, Arábia Saudita e México.
– União Europeia e Reino Unido esticaram o prazo das negociações de seu acordo para um futuro pós-Brexit. Segundo a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen: “demos aos nossos negociadores um mandato para continuar as negociações e ver se um acordo é possível, mesmo que já esteja em um estágio tão tardio”. O Reino Unido já está oficialmente fora da União Europeia desde 31 de janeiro, mas vinha negociando desde março um acordo comercial que supostamente entraria em vigor em 1º. de janeiro de 2021.
– O Brasil foi excluído de um evento organizado para marcar os cinco anos do Acordo de Paris sobre o Clima. O encontro virtual contou com a presença de 77 chefes de estado e governo. Enquanto a reunião ocorria, o presidente eleito dos EUA, Joe Biden anunciava em suas redes que o país voltará a aderir ao Acordo de Paris no primeiro dia de seu mandato em 2021. Prometeu ainda uma meta de reduzir as emissões de carbono americanas a um patamar de neutralidade até 2050. A exclusão do Brasil se deu pelo país não apresentar metas ambientais ambiciosas, segundo os organizadores, mas teve ares de gesto político de tratar o Brasil como pária ambiental. (Com infos de Jamil Chade @jamilchade)
– Faleceu na Bielorússia, aos 100 anos, Liubov Netupskaia, a telegrafista que comunicou a Moscou a rendição incondicional da Alemanha nazista na noite de 8 para 9 de maio de 1945. Liubov chegou a Berlim no exato dia em que Berlim foi capturada, 2 de maio e fez história ao informar sobre a assinatura dos atos de capitulação dos nazistas.
Ana Maria Prestes
A Cientista Social Ana Maria Prestes começou a sua militância no movimento estudantil secundarista, foi diretora da União da Juventude Socialista, é membro do Comitê Central e da Comissão de Política e Relações Internacionais.