Sanções ilegais dos EUA contra o Irã e o mundo livre
As eleições nos EUA, associadas à tragédia da pandemia mundial, trouxeram ao debate internacional a discussão sobre as sanções, bloqueios, conspirações econômicas e isolamento comercial e humanitário dos povos livres do mundo.
Por João Vicente Goulart*
A defesa sanitária e de segurança da soberania destes povos é um direito inviolável de cada nação, que tem em suas culturas, origens, religiões e autonomia política o brio de seu povo em primeiro lugar, para proteger suas nacionalidades.
O acordo do clima de Paris, o fortalecimento da OCM, Organização Mundial da Saúde com a união e aporte de recursos de todos os seus membros no combate mundial a Covid-19 e os tratados internacionais de desarmamento e controle da energia atômica terão necessariamente que serem revistos, para o bem da humanidade.
O Irã e os países P5+1 (China, França, Rússia, Reino Unido, Estados Unidos + Alemanha) chegaram à um acordo sobre seu programa nuclear em 2015, chamado de “Plano de Ação Conjunto Global (JCPOA)”.
Esse acordo faz parte integrante da Resolução 2231. A Resolução 2231 e seus anexos é um pacote em que todas as partes (o P5+1: China, França, Rússia, Reino Unido, Estados Unidos + Alemanha) concordaram após 13 anos de intensas negociações. Sob este acordo, o Irã assumiu certos compromissos e as outras partes deste acordo também aderiram aos compromissos claramente definidos.
Com a política imperialista do governo Trump, no dia 8 de maio de 2018, o governo dos Estados Unidos retirou os EUA do acordo nuclear e violou consistentemente a Resolução 2231. O governo Trump, após a retirada unilateral do acordo multilateral sob a Resolução do Conselho de Segurança da ONU, impôs indiscriminadamente, e como às chamam, as “sanções abrangentes e máximas”, aos bancos, bem como aos sistemas de transporte de outros países que fazem negócios com o Irã. Ele continuou, mesmo após a decisão clara do Tribunal Internacional de Justiça, em 3 de outubro de 2018, na qual os juízes do Tribunal ordenaram que os EUA “levantassem as medidas restritivas relacionadas ao comércio humanitário, alimentação, medicamentos e aviação civil”.
Retirou também os EUA do tratado de Paris, que busca diminuir o aquecimento global, que vem modificando o clima na terra e com consequências imprevisíveis.
É lamentável que os Estados Unidos não apenas tenham violado os termos deste acordo, mas também tentado impor sua vontade às outras Nações e à Organização das Nações Unidas de violarem seus compromissos. Esta prática desconsidera todas as regras bem estabelecidas do Direito Internacional que formaram-se a longo prazo para salvar o mundo do caos e da ilegalidade e que, pela primeira vez na história da ONU, um membro do Conselho de Segurança está punindo os Estados cumpridores da lei e os setores privados por não violarem essa Resolução que busca promover e facilitar o desenvolvimento das interações econômicas, comerciais e de cooperação com o Irã.
A administração Trump é culpada de quebrar o princípio mais fundamental do Direito Internacional, que é pacta sunt servanda ou simplesmente “Acordos devem ser mantidos”. É clara e lógica que tal comportamento de intimidação seja denunciado como a grande causa da não manutenção da paz e da segurança em um mundo volátil ao qual vivemos.
O surto do coronavírus continua aumentando e diariamente envolve mais pessoas. Sua proliferação foi declarada como uma pandemia pela Organização Mundial da Saúde, o que significa que está se espalhando rapidamente em diferentes partes do mundo e reivindicando vítimas sem considerar as diferenças políticas, religiosas, étnicas e raciais. Tais características de uma pandemia, exigem esforços de todos os países, independentemente de suas diferenças políticas, trabalhando sob acordos internacionais para resolvê-la.
Um desastre global precisa de cooperação global para combatê-lo. Isso é algo que dificilmente deve ser entendido por aqueles que defendem o unilateralismo contra o multilateralismo. As sanções econômicas impostas pelos americanos dificultam o combate à doença no Irã, em Cuba, na Venezuela e tantos outros países, apenas porque o império não gosta de seus governos.
Este posicionamento anti-humanidade se reflete também nos governos subservientes, como o Brasil e o desgoverno Bolsonaro em relação à sua política externa, pondo fim ao multilateralismo, por anos praticado pelo Itamaraty como exemplo de política externa.
Esta situação se agrava devido a dificuldade de acesso à compra destes materiais de saúde publica, e como todos sabem, são sanções ilegais impostas a nações non-gratas pelos EUA, que impedem estas, de dirimir este problema emergencial. Não só comprar, como também receber ajuda dos países amigos, que são sancionados se o fizerem.
Segundo a OMS, o Irã está à frente na batalha contra o coronavírus, e de longe, é o país mais atingido no Oriente Médio, ampliando todos os elementos de sua resposta compreensiva para isso. Mas a capacidade de recuperação do Irã está prejudicada pela falta de equipamentos médicos e de recursos financeiros necessários para a aquisição desses equipamentos. Sanções ilegais, em flagrante violação da Resolução 2231 do Conselho de Segurança da ONU e sob o pretexto de uma campanha de pressão máxima por parte da Administração dos EUA, são a principal causa. Enquanto o dinheiro da Nação foi congelado em alguns bancos estrangeiros, o governo enfrenta desafios orçamentários para fornecer segurança financeira às famílias de baixa renda por meio de transferências de renda. As sanções estão reforçando os efeitos da pandemia. As sanções matam mais do que a própria pandemia.
O Ministro das Relações Exteriores da República Islâmica do Irã, o Dr. Mohammad Javad Zarif, em sua entrevista exclusiva à Folha de São Paulo, em 20 do março de 2020, chamou tais comportamentos, tão desumanos, como sendo terrorismo médico. Não deixa de ser.
Isto direciona os esforços do Governo Iraniano para adquirir equipamentos médicos e alimentos para ajudar o povo iraniano. Tais medidas flagrantes estão enfraquecendo a capacidade do país em lidar com a grave crise de saúde no país.
É uma expectativa legítima que outras Nações pressionem o governo dos Estados Unidos a interromper suas sanções, pelo menos durante o período crítico de negociação, para aplainar o coronavírus e evitar mais vítimas inocentes. Agora, cabe à comunidade internacional enfrentar coletivamente esse tipo de bullying dos EUA, parar de aderir à comportamentos desumanos unilaterais e não poupar esforços para mitigar o efeito das medidas das sanções.
Este tipo de ação terrorista praticada pelos EUA, é sem dúvidas um crime contra os povos livres.
Vivemos uma expectativa de mudança nas relações internacionais entre os povos, com mais solidariedade, mais humanismo, menos conflitos bélicos, mais amizade entre as mulheres e homens que constituem nossa civilização.
Esperamos que aconteça.
* Filósofo, poeta e escritor. Membro do Comitê Central do PCdoB. Autor dos livros “Entre Anjos e Demônios, poemas do exílio” e “Jango e eu: memórias de um exílio sem volta”, este foi finalista do prêmio de literatura Jabuti na categoria Biografia. Preside o Instituto João Goulart desde 2004.