Visão Global

Taiwan: Provocação contra China é sinal de uma escalada perigosa

Um cartaz saúda a visita da presidente da Câmara dos Deputados dos EUA, Nancy Pelosi, em Taipé, Taiwan / Foto: Chiang Ying Ying-AP

A turbulenta visita de Nancy Pelosi, presidente da Câmara dos Representantes dos EUA (equivalente à Câmara dos Deputados no Brasil) à Taiwan, onde desembarcou nesta terça-feira (2) na capital, Taipé, releva de forma inequívoca que os EUA escolheram a confrontação aberta para deter as mudanças geopolíticas que colocam em xeque sua hegemonia.

Wevergton Brito Lima*

A ilha de Taiwan até hoje ostenta “República da China”, como nome oficial. Em 1971 a Organização das Nações Unidas, através da resolução 2578, reconheceu oficialmente a República Popular da China como “único representante legítimo da China perante as Nações Unidas”.

Desde então, a RPC só estabelece relações diplomáticas com aqueles países que reconheçam o princípio de “uma só China”, o que os EUA, Brasil e centenas de países em todo o mundo fizeram, tendo como consequência o não reconhecimento da “República da China”, e estabelecendo com Taiwan apenas relações não oficiais (tratados de comércio, culturais, etc.).

China e EUA, por meio de comunicados conjuntos, reafirmaram em três ocasiões diferentes este preceito.

A visita de Nancy Pelosi foi antecedida por avisos duros do governo Chinês, ignorados por Washington. Sua concretização significa que os EUA, na prática, rasgam os tratados assinados, renegam as declarações conjuntas e estimulam abertamente as aspirações independentistas da ilha que a China considera uma “província rebelde”, ao enviar em visita oficial à “República da China”, uma de suas principais dirigentes.

Neste caso, pouco irá importar o discurso que Pelosi fez ou irá fazer durante a estadia em Taiwan, com um tom mais ou menos apaziguador em relação a China: o gesto de visitar a ilha já é, por si só, a mensagem principal e é justamente assim que a China está interpretando. Em comunicado divulgado logo que o avião de Pelosi pousou em Taipé, a chancelaria chinesa afirmou que a visita:

É uma violação severa do princípio de Uma Só China e as estipulações dos três comunicados conjuntos China-EUA. Tem impacto severo na base política das relações China-EUA, infringe severamente a soberania e a integridade territorial da China, prejudica severamente a paz e a estabilidade no Estreito de Taiwan, e emite um sinal severamente errado às forças secessionistas da ‘independência de Taiwan’.”

O texto também adverte que “a China definitivamente tomará todas as medidas necessárias para salvaguardar resolutamente sua soberania e integridade territorial em resposta à visita da presidente da Câmara dos Representantes. Todas as consequências decorrentes disso devem ser suportadas pelo lado dos EUA e pelas forças separatistas“.

Já o tom do Global Times, jornal que expressa de forma não oficial as opiniões da China, é ainda mais assertivo. Diz, em matéria publicada também nesta terça-feira, que a visita de Pelosi irá “acelerar o processo de reunificação”. Segundo o jornal, “Há muitas opções na mesa para a China acelerar o processo de reunificação. Isso pode incluir o ataque a alvos militares de Taiwan, assim como o ELP fez na crise anterior do Estreito de Taiwan, impondo uma nova legislação para a reunificação nacional, enviando aeronaves e navios militares para entrar no ‘espaço aéreo’ e nas ‘águas territoriais’ da ilha controladas pelas autoridades de Taiwan e pondo fim ao cessar-fogo tácito com os militares de Taiwan”. Para o Global Times, não existem motivos de apreensão por parte da China, pois a visita de Pelosi “não mudará as vantagens esmagadoras, especialmente a militar, mantidas pelo continente contra as autoridades de Taiwan e os EUA na região”.

Pelosi declarou, em sua chegada a Taipé, que a “visita de nossa delegação congressual honra o compromisso inabalável com o apoio à vibrante democracia de Taiwan”, e negou que esta visita represente um rompimento com as declarações conjuntas China-EUA.

No entanto, Washington sabe muito bem que, ao contrário de Porto Rico, país que jamais fez parte do território estadunidense e que foi invadido em 1898 sendo até hoje uma colônia americana, Taiwan sempre foi chinesa, ou seja, é uma questão interna da China que, como qualquer país que se preza, é muito ciosa com sua soberania e com ainda mais razão a China, país que viveu a tragédia do “século de humilhação” com a sucessiva e criminosa invasão de potências coloniais e imperialistas.

Com a visita de Pelosi consumada, o governo Biden aposta intencionalmente no aumento das tensões militares, eleva as ameaças à já combalida paz mundial e mostra mais uma vez que o imperialismo, diante dos seus dilemas, apostará nas provocações e na guerra como forma de preservar sua cada vez mais enfraquecida hegemonia mundial.

* Editor do i21, membro da Comissão de Relações Internacionais do PCdoB, vice-presidente do Centro Brasileiro de Solidariedade aos Povos e Luta pela Paz

 

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