Extrema-direita chilena repete Trump e ameaça não reconhecer resultado da eleição
A poucos dias da eleição chilena, o candidato da extrema direita, José Antonio Kast, o presidente da partido Renovación Nacional, Francisco Chahuan e outro líder da extrema-direita, Sebastián Izquierdo, que apoia Kast, fizeram declarações abrindo a possibilidade de ignorar os resultados da eleição deste domingo, chamando seu apoiadores a ” hacer trampa” (trapacear) e “objetar todos os votos de (Gabriel) Boric.”
As falas dos representantes da direita e da extrema-direita semearam uma dose extra de tensão e alerta em torno do processo eleitoral como nunca havia acontecido nos 30 anos após a ditadura, onde todos os setores aceitaram e respeitaram os resultados divulgados pelo Serviço Eleitoral na noite das eleições, algo elogiado no país e no exterior.
“Isso pode não ser resolvido no domingo”, disse o presidente da Renovação Nacional desafiadoramente. Ele opinou, especulando cenários, que “é possível que a diferença seja tão minúscula que isso vá para a Justiça Eleitoral”.
Enquanto isso, Kast declarou que “pode haver erros” na contagem dos votos … E frisou, dizendo que “se a diferença for estreita, como 45 mil votos, temos que esperar a contagem que é feita nas escolas de votação no dia seguinte“. No cenário de perder por algumas dezenas de milhares de votos, Kast advertiu que não reconheceria o triunfo de Gabriel Boric e que esperaria “que os escrutinadores determinem se essa diferença muda ou não“.
Essas declarações sugerem que os números que sejam divulgados no domingo podem não ser reconhecidos por Kast e pelos partidos de direita, como nunca aconteceu no país nas últimas décadas.
A preocupação e a tensão aumentam se considerarmos as declarações do presidente do conselho diretor do Serviço Eleitoral (Servel), Andrés Tagle, dizendo que os resultados divulgados no domingo “são preliminares” e “não têm valor legal de escrutínio e nem tampouco têm o poder de declarar vencedores.”
Isso ajudaria a tese de Kast, da direita e da extrema direita. Não se deve esquecer que Tagle foi o gestor eleitoral da direitista União Democrática Independente (UDI) e agora é o responsável pelo órgão eleitoral devido ao pacto de distribuição de cargos públicos por períodos firmado durante a transição entre os partidos políticos.
Tudo isso pode levar à judicialização das eleições presidenciais e colocar o país em uma crise institucional, na qual José Antonio Kast e os setores conservadores não hesitariam de provocar se o legítimo vencedor for Gabriel Boric.
Uma tática de Trump e Bolsonaro
O que foi colocado na mesa pelos dirigentes de direita é uma tática semelhante à seguida por Donald Trump e que foi transmitida a Kast pelo ultraconservador senador Marco Rubio, que assessorou o ex-presidente norte-americano. Esse caminho poderia ter sido apontado na reunião realizada há algumas semanas pelos dois políticos em Washington.
Trump – em sua disputa com Joe Biden – primeiro disse que os resultados eram limitados, que o vencedor não poderia ser antecipado e, finalmente, queria ir ao tribunal para decidir as eleições. A mesma coisa levantada agora no Chile por Kast e Chahuan.
Judicializar o processo eleitoral também é uma tática que o presidente de extrema direita do Brasil, Jair Bolsonaro, tem recorrido. Bolsonaro chegou a afirmar que a fraude contra ele estava pronta e que não aceitaria resultados entregues pelos órgãos legais.
“A forma já não importa, o que importa é a vitória”
Sebastián Izquierdo é o chefe de um grupo de extrema direita, uma pessoa politicamente próxima de José Antonio Kast e ambos têm registros fotográficos juntos promovendo a candidatura presidencial. Izquierdo trabalhou ligado ao comando Kast e à campanha da ultradireita.
Acontece que dois dias antes da eleição, em meio a análises que indicam que a disputa será renhida, o apoiador do Kast convocou nas redes sociais os apoiadores para “ir votar, e não só votar, se cadastrar como mesários, e mais importante que defender os votos Kast, obstar todos os votos de Boric. Esses vão trapacear, então vamos trapacear também”.
E continuou Sebastián Izquierdo: “Sejam mesários e se oponham a todos os votos bóricos. Se lhes couberem ser vogais de mesa também. Vamos obstar todos os votos para Boric, não um ou dois, todos os votos. A vitória é o mais importante, as formas já não importam”.
Sabe-se que grupos de partidários de Kast decidiu seguir o caminho indicado por Sebastián Izquierdo e se preparam para trapacear, provocar brigas e episódios violentos onde o Boric tenha vantagem, e até o fechamento desta edição não houve manifestação de Kast ou de seu comando ou de líderes de direita rejeitando as palavras de Izquierdo.
O presidente da Servel foi forçado a estabelecer que “obviamente é uma coisa incorreta, inadequada. Somos bombardeados com este tipo de falsidades deliberadas nas redes sociais da última vez e que afetam a credibilidade do sistema e eu as rejeito veementemente”.
Boric: “Não vou questionar os resultados da eleição”
Diante disso, o candidato presidencial da coligação Apruebo Dignidad, Gabriel Boric, declarou que “confio nos chilenos e também nas instituições chilenas que entregarão os resultados quando for apropriado e não questionarei os resultados da escolha popular”.
Ele acrescentou que, “o que a extrema direita está fazendo no Chile é seguir o manual: é exatamente o mesmo que (Donald) Trump fez. Eles estão começando a questionar eventuais resultados.”
Boric declarou que “já instalaram uma campanha de mentiras por todo o lado e passaram a questionar instituições como a UC (Universidade Católica), inventaram para mim fichas médicas falsas, inventaram histórias de família inexistentes. Eles estão absolutamente descontrolados”.
Axel Callís, diretor do “Tú Influyes” e especialista eleitoral, postou nas redes sociais que “é absurdo e delirante prever que essa eleição vai acabar na justiça. As cédulas com voto voluntário são de resultados claros. As declarações do tipo fraude vêm do manual Trump”.
Com esta nova situação, a extrema direita continua a pressionar o ambiente nacional e, como vários líderes da oposição afirmaram nos últimos dias, aquele setor recorreria a todos os meios para evitar uma derrota ou para não reconhecer o triunfo de Boric.
Fonte: El Siglo