Visão Global

Iêmen, esperança em meio ao caos

Hans Grundberg. enviado especial da ONU para o Iêmen

A formação de um poder executivo colegiado e a trégua de dois meses em vigor desde 2 de abril são raios de esperança para milhões de iemenitas que sofrem as consequências da guerra iniciada em 2014, causando uma crise humanitária sem precedentes no país.

Por Roberto Castellanos Fernández*

Sob os auspícios do enviado especial da ONU para o Iêmen, Hans Grundberg, as partes em conflito concordaram em suspender “todas as operações militares ofensivas aéreas, terrestres e marítimas dentro do Iêmen e além de suas fronteiras“.

Grundberg destacou a importância do acordo ao apontar que é a primeira cessação das hostilidades a nível nacional em seis anos. “Esta é uma rara oportunidade em uma guerra longa e brutal para avançar em direção a uma solução política“, disse ele.

A trégua serviu para pôr fim a semanas de combates sangrentos, que permitiram que o Exército e milícias aliadas, como a Brigada dos Gigantes, avançassem nas províncias de Taiz, Marib e Shabwa.

Em resposta, os houthis lançaram inúmeros ataques de drones no território da Arábia Saudita e dos Emirados Árabes Unidos, considerando que este último país patrocina a brigada.

Embora as partes em conflito se acusem mutuamente de violar o acordo, a verdade é que a intensidade dos confrontos diminuiu significativamente, especialmente em Marib, epicentro de uma ofensiva rebelde há um ano.

A província é fundamental pelos seus recursos petrolíferos, localização geográfica (ligando norte e sul) e por ser o último reduto do governo na região.

Novo governo

Paralelamente à pausa nos combates, várias facções iemenitas reunidas na Arábia Saudita mantiveram um diálogo para buscar um consenso para acabar com a conflagração.

Sem a presença dos houthis, a reunião terminou com a surpreendente transferência de poderes do presidente Abd Rabbu Mansour Hadi para o recém-criado Conselho de Liderança Presidencial, composto por oito membros.

Celebrado por vários países árabes da região, o acordo busca fortalecer a frente anti-rebelde e reflete a variada realidade no terreno ao dar mais presença a diversos setores.

O órgão será encabeçado pelo ex-ministro do Interior Rashad Al Alimi, ligado ao partido islâmico Islah.

Al Alimi será acompanhado, entre outros, pelo sultão Al Aradah, governador de Marib; Brig Al Zubaidi, chefe visível do movimento secessionista do sul; Tariq Saleh, sobrinho do ex-presidente Abdullah Saleh e chefe de uma milícia armada, e Abdurahman Al Muharrami Abu Zaraa, comandante da Brigada dos Gigantes.

De acordo com Hadi, o comitê liderará as negociações com os houthis e trabalhará para encontrar uma solução política para o conflito, incluindo um período de transição e eleições gerais.

Outro gesto que não passou despercebido foi a decisão da Arábia Saudita de libertar 163 houthis em maio, contra quem luta desde 2015 como parte de uma coalizão árabe.

Apesar desses avanços, enquanto o fim da trégua se aproxima, analistas e a mídia regional estão cautelosos com a extensão do pacto.

“Nossa primeira opção é a paz, mas estamos prontos para a guerra”, alertou Al Alimi em entrevista recente a uma agência internacional, diante da possível retomada dos combates.

Até agora, os rebeldes se recusaram a negociar com o Conselho, apesar das ofertas e sugestões feitas.

A crise humanitária causa estragos

Enquanto os atores políticos se dividem entre a guerra e a paz, a crise humanitária atinge a maioria da população.

Mais de 23 milhões de pessoas, ou quase três quartos da população, agora precisam de assistência, três milhões a mais que no ano passado, alertou o coordenador humanitário das Nações Unidas para o Iêmen, David Gressly. Peço a todos os doadores que desembolsem os fundos prometidos rapidamente, disse o funcionário em um comunicado recente.

Precisamente, o Fundo de População das Nações Unidas lamentou a insuficiente ajuda financeira internacional. Desde o início do ano, a falta de dinheiro nos obrigou a reduzir as intervenções de saúde e proteção reprodutiva que salvam muitas vidas aqui, ressaltou.

Por sua vez, o Escritório das Nações Unidas para a Coordenação de Assuntos Humanitários especificou em um relatório que 19 milhões de iemenitas precisam de ajuda alimentar e 21,9 milhões de apoio para acessar serviços críticos de saúde.

*Correspondente-chefe da Prensa Latina no Egito

Fonte: Prensa Latina

 

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