PCdoB – Pronunciamentos

Reunião de dez partidos comunistas do Cone Sul emite declaração

Nos dias 26, 27 e 28 de abril, dez partidos da América do Sul reuniram-se em Montevidéu. O PCdoB participou com uma delegação composta por Walter Sorrentino, Vice-Presidente e Secretário de Política e Relações Internacionais, Ana Prestes, membro da Comissão Política do CC e integrante da executiva da Comissão de RI e Raul Carrion, também integrante da executiva da Comissão de RI. O Encontro aprovou uma declaração conjunta que publicamos a seguir.

Declaração do Encontro de Partidos Comunistas da América do Sul

Em Montevidéu, em abril de 2019, os Partidos Comunistas da América do Sul, inspirados nas lutas dos comunistas sul-americanos que se reuniram pela primeira vez na Primeira Conferência dos Partidos Comunistas Sul-Americanos de 1929, e proclamando-nos seus continuadores e como “aqueles comunistas” herdeiros dos Povos Originários, Artigas, Bolívar, Sucre, San Martin, Gaspar Rodríguez de Francia, Hidalgo, Miranda, O’Higgins e também de Mariátegui, Recabarren, Agosti, Ponce, Prestes, Arismendi, Allende, Chávez, Fidel e Che Guevara, cujos exemplos de luta nos inspiram, declara:

1 – A conjuntura atual do mundo é marcada pela crise geral do capitalismo especulativo financeiro, impulsionado pelos estados imperialistas gerando uma ordem concentrada e excludente, sustentada através de guerras de rapina, procurando se apropriar dos recursos naturais e do produto do trabalho de milhões de pessoas, impedindo qualquer possibilidade de soberania e desenvolvimento independente. Isto se materializa com a imposição de mecanismos comerciais e financeiros como o Banco Mundial, o Fundo Monetário Internacional, entre outros, assegurando o domínio global de suas empresas transnacionais, que se apropriam do excedente dos países menos desenvolvidos, inserindo-nos no processo de globalização de uma forma subordinada, perpetuando a primarização das nossas economias, o que também gera uma desindustrialização do aparelho produtivo de nossos países, depredam a natureza, ameaçam a existência do planeta e a sobrevivência dos seres humanos.

2 – Na região da América Latina, estamos passando por um processo perigoso de regressão política e social do campo popular, que permitiu o retorno do neoliberalismo ainda mais agressivo do que nos estágios anteriores, como vemos nos governos do Chile, Argentina e Paraguai. Inclusive com o surgimento de governos de ultra direita, como no Brasil e na Colômbia, configurando uma contra ofensiva imperialista e neocolonialista com as oligarquias locais a serviço do imperialismo estadunidense, e de erros e equívocos das forças políticas de esquerda, populares e progressistas, aos quais devemos analisar criticamente para corrigi-los e retomar a ofensiva.

3 – Esses governos e outros, nucleados no Grupo de Lima, pretendem acabar com os mecanismos de integração complementar e soberana, com a cooperação solidária, substituindo-os por meros acordos comerciais a serviço das transnacionais, como a recém-lançada proposta do PROSUR. Estamos particularmente preocupados com a liquidação da UNASUL, a paralisia da CELAC, bem como a estagnação dos espaços políticos do Mercosul e o recuo da OEA para o papel de um simples ministério de colônias nos Estados Unidos, liderado por Luis Almagro, que se tornou um fantoche pró-americano, expulso por unanimidade da Frente Ampla do Uruguai.

4 – A situação atual e o breve tempo em que a contraofensiva pró-imperialista conseguiu impor retrocessos aos povos exige uma avaliação das lutas atuais e uma ação rápida que construa uma nova correlação de forças e permita ao campo popular e aos trabalhadores como um todo manter os governos (Bolívia e Uruguai) e recuperar (Argentina) retomando os projetos de governos populares democráticos para abrir perspectivas com horizontes socialistas.

5- As e os comunistas sul-americanos trabalharão para superar a fragmentação existente, promovendo a mais ampla unidade de forças sociais e políticas para enfrentar o imperialismo e o neoliberalismo, combatendo o sectarismo e o dogmatismo, com ética e honradez em nossos coletivos e individualmente. Fortalecendo nossa identidade política e programática.

6 – Comprometemo-nos a estabelecer mecanismos de comunicação e disseminação de informação entre nossos partidos, para enfrentar as “fake news” e possibilitar uma análise da realidade nacional em conjunto com a realidade regional, para atuar junto às forças populares, progressistas e democráticas e enfrentar o surgimento de expressões neofascistas na América do Sul e a ofensiva neoliberal.

7 – No nível continental, a organização política mais representativa da esquerda regional é, sem dúvida, o Fórum de São Paulo. Os comunistas sul-americanos trabalharão para fortalecer essa ferramenta e seu vínculo com as organizações sociais aliadas, na formação de uma frente comum contra o imperialismo, em defesa da democracia e da paz. Formulado no âmbito do FSP, o Consenso de Nossa América é uma contribuição política e programática para a ação conjunta das forças progressistas, populares e revolucionárias. Valorizamos o Encontro dos Partidos Comunistas da América Latina e do Caribe e o Encontro Internacional dos Partidos Comunistas e Operários.

8 – As e os comunistas sul-americanos consideram a “Nossa América” como uma unidade, com as diferenças e singularidades entre os países, mas nosso caminho é um só. Com Mariátegui aprendemos que “o socialismo não é decalque nem cópia, mas criação heroica”. O socialismo não é nem um dogma nem uma linha reta, é uma teoria e uma prática transformadora, ligadas a uma realidade histórica.

A este respeito, afirmamos:

  1. O direito de cada país escolher o sistema político e social que seu povo decida, rejeitando qualquer tipo de intervenção que viole os princípios de soberania e não-intervenção consagrados na Carta das Nações Unidas.
  2. Nosso total apoio à Revolução Cubana, que trouxe à prática a construção do socialismo em nossa América, sob a orientação de Fidel, Raúl, Vilma, Camilo e Che e da nova geração de revolucionárias e revolucionários cubanos. Nossa rejeição ao bloqueio criminoso e à lei Helms-Burton, exacerbada hoje pela aplicação do Capítulo III da norma.
  3. Apoiamos o povo e o governo da irmã República Bolivariana da Venezuela em sua luta para construir seu próprio caminho soberano, bem como condenamos fortemente o bloqueio financeiro, a guerra econômica imposta pelos Estados Unidos, seus aliados e a ameaça de intervenção militar. Damos a nossa maior solidariedade e procuramos expressá-la de maneira concreta e tangível. Repudiamos completamente as repetidas tentativas de golpe da direita, hoje expressas na modalidade das autoridades autoproclamadas, como é o caso de Juan Guaidó. Apoiamos o Mecanismo de Montevidéu promovido pelos governos da Bolívia, México, Uruguai e CARICOM, que buscam um diálogo sem condições que permita encontrar uma solução pacífica para a crise.
  4. Apoiamos o atual processo de mudança socioeconômica e política na Bolívia, que tem o desafio de sua continuidade e aprofundamento com medidas de conteúdo democrático, popular, anti-imperialista e anti-oligárquico, sob a liderança do companheiro presidente Evo Morales.
  5. Expressamos nosso apoio ao processo de diálogo pela paz promovido pelo governo da Frente Sandinista na Nicarágua e rejeitamos a violência promovida pelo imperialismo e exercida pela direita nicaraguense como mecanismo para resolver as diferenças políticas.
  6. Saudamos o triunfo no México de um governo progressista liderado pela organização Morena – o partido de Manuel López Obrador -, o que constitui uma grande vitória para o povo daquele país que finalmente conseguiu impor sua vontade, uma importante derrota para o governo dos Estados Unidos e uma contribuição significativa para o equilíbrio da correlação de forças na região.
  7. Exigimos do governo colombiano o cumprimento dos acordos de paz, a cessação imediata da repressão e do assassinato dos ativistas sociais e militantes revolucionários, bem como o estabelecimento de uma paz duradoura com garantias.
  8. Seguimos com preocupação a situação do Brasil, onde é evidente a escalada autoritária com a consolidação do golpe contra Dilma Rousseff e a chegada do ultradireitista Jair Bolsonaro ao governo, acompanhado pelos setores mais conservadores da sociedade brasileira, incluindo tendências pró fascistas. Apoiamos a campanha “Lula Livre” como uma elevada expressão de luta em defesa da democracia e dos direitos do povo brasileiro.
  9. A experiência da Frente Ampla do Uruguai em construir a unidade na diversidade para a conquista do quarto governo consecutivo deve ser valorizada e estudada em profundidade.

Bancada do PCdoB, a partir da direita p/ esquerda: Raul Carrion (blazer escuro), Walter Sorrentino e Ana Prestes

A partir deste Encontro de Partidos Comunistas Sul-Americanos chamamos a conformação de um grande bloco político e social de mudanças, amplo, patriótico, anti-imperialista, anti-neoliberal, democrático, popular, em que se reconheça a diferença e as diversas pluralidades que expressam as lutas, para democratizar as relações econômico-sociais e jurídico-institucionais, ampliando a participação efetiva do povo nos governos populares e progressistas.

Finalmente, persistimos no sonho de construir uma Pátria Grande, unida, soberana e próspera como nossos heróis sonhavam. Para isso, devemos defender a democracia como uma ferramenta para consolidar um continente de paz e justiça social no caminho para o socialismo.

A paz não é apenas uma condição necessária para a continuidade da vida na Terra e um anseio básico de todo ser humano, mas também para a construção do socialismo pelo qual combatemos os comunistas. A paz, juntamente com a mais ampla democracia e a erradicação da impunidade, garantirão o presente e o futuro de nossos povos, onde podemos conquistar mais direitos para todos, especialmente os direitos daqueles que criam riqueza: os trabalhadores.

Como bem expressou Rodney Arismendi em “Problemas da Revolução Continental”, “a diversidade é uma manifestação múltipla da Unidade … a Unidade da Revolução Latino-Americana não exclui, mas implica a diversidade de processos nacionais, a riqueza de táticas, ritmo diferente dos desenvolvimentos, a intensidade variada da luta de classes, a gama infinita de episódios políticos … mas entendemos por tal uma única revolução latino-americana”.

Montevidéu, 28 de abril de 2019

Partido Comunista da Argentina, Partido Comunista da Bolívia, Partido Comunista do Brasil, Partido Comunista Brasileiro, Partido Comunista do Chile, Partido Comunista Colombiano, Partido Comunista Paraguaio, Partido Comunista do Peru – Patria Roja, Partido Comunista do Uruguai, Partido Comunista da Venezuela

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